A detalhada discussão da mistanásia que acabamos de apresentar é importante, em primeiro lugar, para explicar o que se entende por mistanásia e, em segundo lugar, para ajudar-nos a entender melhor aquilo que a eutanásia não é. No meio de tanta confusão terminológica, a abordagem do tema pela via negativa facilita o processo de esclarecimento pelo qual um determinado tipo de comportamento se identifica corretamente como sendo eutanásia, o que é indispensável para poder emitir com serenidade um juízo ético fundamentado.
É pouco provável que os comportamentos que acabamos de caracterizar como mistanásia tenham seus defensores do ponto de vista da ética, mas a eutanásia, para muita gente, continua uma questão aberta. É justamente por isso que queremos examinar a eutanásia levando em consideração o resultado que provoca, a intenção ou motivação que se tem para praticar o ato, a natureza do ato e as circunstâncias. Também, precisamos distinguir entre o valor moral, considerado objetivamente, que se pode atribuir a um ato eutanásico e a culpa ética ou jurídica que se pode atribuir num determinado caso.
Uma das grandes diferenças entre a mistanásia e a eutanásia é o resultado. Enquanto a mistanásia provoca a morte antes da hora – de uma maneira dolorosa e miserável –, a eutanásia provoca a morte antes da hora de uma maneira suave e sem dor. É justamente este resultado que torna a eutanásia tão atraente para tantas pessoas. A grande preocupação dos partidários da eutanásia é justamente tirar da morte o sofrimento e a dor e a grande crítica que eles fazem aos que rejeitam a eutanásia é que estes são desumanos, dispostos a sacrificar seres humanos no altar de sistemas morais autoritários que valorizam mais princípios frios e restritivos que a autonomia das pessoas e a liberdade que as dignificam.
Não há dúvida que, aqui, existem elementos éticos de peso: o direito do doente crônico ou terminal ter sua dor tratada e, quando possível, aliviada; a preocupação em salvaguardar, ao máximo, a autonomia da pessoa e sua dignidade na presença de enfermidades que provocam dependência progressiva e a perda de controle sobre a vida e sobre as funções biológicas; e o próprio sentido que se dá ao fim da vida e à morte.
Resta, porém, a questão: se a eutanásia é tão desejável como seus defensores afirmam, por que há tanta resistência, durante tanto tempo, por parte da ética médica codificada e por parte da teologia moral?
Pelo menos uma parte da resposta reside no próprio resultado que a eutanásia traz. O grande objetivo é proteger a dignidade da pessoa, eliminando o sofrimento e a dor. A dificuldade, do ponto de vista da ética médica codificada e da teologia moral, é que, na eutanásia, se elimina a dor eliminando o portador da dor. O Código de Deontologia Médica de 1931 expressa bem este dilema no seu artigo 16. Primeiro, afirma que “o médico não aconselhará nem praticará, em caso algum, a eutanásia”. Em seguida, afirma que o médico tem o direito e o dever de aliviar o sofrimento, “mas esse alívio não pode ser levado ao extremo de dar a morte por piedade”. A postura adotada é sedar, sim; matar, não. A partir do Código de Deontologia Médica de 1945 (artigo 4º. 5) os códigos brasileiros de ética médica não mais utilizam o termo eutanásia, porém a reprovação da morte proposital por mão de médico permanece firme.
No atual Código, de 1988, o artigo 6º dá continuidade a esta tradição afirmando claramente a preocupação com o valor da vida humana quando diz: “O médico deve guardar absoluto respeito pela vida humana, atuando sempre em benefício do paciente. Jamais utilizará seus conhecimentos para gerar sofrimento físico ou moral, para o extermínio do ser humano ou para permitir e acobertar tentativa contra sua dignidade e integridade”. Esta formulação vai muito além de qualquer concepção biologista do ser humano, afirmando que o tratamento deve ser em benefício do paciente, que não se deve usar a medicina para gerar sofrimento, nem para ofender a dignidade e integridade das pessoas e, menos ainda, para o extermínio do ser humano.
Como complemento desta afirmação de princípios, dentro da grande tradição da benignidade humanitária, o Código veda ao médico: “Utilizar, em qualquer caso, meios destinados a abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu responsável legal” (artigo 66).
A moral católica, nos seus textos oficiais, adota uma postura semelhante quando declara moralmente reprovável a eutanásia, entendida como “uma ação ou omissão que, por sua natureza ou nas intenções, provoca a morte a fim de eliminar toda a dor”. Esta afirmação da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé é reforçada pelas palavras do Papa João Paulo II,
na sua Carta Encíclica Evangelium Vitae n° 65, quando confirma que “a eutanásia é uma violação grave da lei de Deus, enquanto morte deliberada, moralmente inaceitável de uma pessoa humana”.
Resumindo, podemos perceber no resultado da eutanásia dois elementos: a eliminação da dor e a morte do portador da dor como meio para alcançar este fim. A ética médica codificada e a teologia moral acolhem o primeiro elemento, o tratamento e a eliminação da dor, e recusam o segundo elemento, a morte direta e proposital do portador da dor. Quando se condena a eutanásia, não é o controle da dor, nem a defesa da dignidade da pessoa humana doente ou moribunda que se condena, mas, sim, aquela parte do resultado que acaba matando a pessoa a fim de matar sua dor. O desafio é como defender e promover os valores positivos da eutanásia (quem não queria uma boa morte, suave e sem dor?) sem cair no extremo de matar a pessoa depositária da dignidade humana que fundamenta todos os outros direitos.
Outra grande diferença entre a mistanásia e a eutanásia é a intenção ou motivação que se tem para praticar o ato. Em certas formas de mistanásia, especialmente por má prática, existe a intenção de usar a medicina para prejudicar o doente crônico ou terminal, retirando vantagem desta situação. Para um comportamento se caracterizar como eutanásia, porém, é importante que a motivação e a intenção visem beneficiar o doente. Apressar o óbito de um doente terminal com a intenção de ganhar mais rapidamente a herança seria mistanásia, se não simplesmente assassinato. Apressar o óbito deste mesmo doente terminal, motivado por compaixão e com a intenção de mitigar seu sofrimento, seria eutanásia. Boas intenções não levam, necessariamente, a bons resultados. Compaixão por aquele que sofre é, sem dúvida, um sentimento que enobrece a pessoa. Quando esta compaixão tem como resultado o alívio da dor e a criação de estruturas de apoio que melhorem o bem-estar do doente terminal, estamos diante de uma postura eticamente louvável. Quando, porém, esta compaixão leva a um ato médico que diretamente mata o paciente, acaba-se tirando da pessoa não apenas a possibilidade de sentir dor mas, também, qualquer outra possibilidade existencial.
Na administração de analgésicos aos pacientes em fase avançada da sua doença, a questão de intenção pode assumir uma importância muito grande na avaliação ética do procedimento. Quando, por compaixão, se aplica o analgésico com a finalidade de abreviar a vida, estamos diante de um caso de eutanásia. Quando, porém, se aplica o analgésico com a finalidade de aliviar a dor e mitigar o sofrimento, em doses não-letais, mesmo se com isso pode haver como efeito colateral um certo encurtamento da vida, estamos diante de uma situação diferente. No primeiro caso, um ato tem como seu principal efeito algo mau (matar diretamente alguém) e um efeito secundário bom (eliminar a dor), enquanto no segundo caso o ato tem como seu principal efeito algo bom (eliminar a dor) e um efeito secundário mau (indiretamente, apressar a morte de alguém). No segundo caso, pode-se ver que a diferença reside precisamente na intenção: fazer o bem, aliviando a dor; e na natureza do ato que também é bom: sedar para promover o bem-estar do paciente. O procedimento se justifica pelo princípio do duplo efeito pelo qual se pode fazer algo bom (sedar), com intenção reta (aliviar a dor), mesmo se isso tiver um efeito secundário negativo (apressar o processo de morrer num caso onde a terminalidade irreversivelmente se instalou).
A distinção entre ação direta e resultados secundários aqui percebida não pode ser transformada em critério de aplicação mecânica, mas pode ser de grande utilidade mais adiante, na discussão sobre a distanásia e o sentido de prolongar indefinidamente a vida humana em certas circunstâncias. Para ajudar na clarificação terminológica, nesta fase da discussão, sugerimos que o termo eutanásia seja reservado apenas para a ação ou omissão que, por compaixão, abrevia diretamente a vida do paciente com a intenção de eliminar a dor e que outros procedimentos sejam identificados como sendo expressões de mistanásia, distanásia ou ortotanásia, conforme seus resultados, intencionalidade, natureza e circunstâncias. Dentro desta perspectiva que estamos desenvolvendo, ainda falta considerar um pouco mais a fundo a natureza do ato eutanásico e as circunstâncias em que se realiza. Uma ambigüidade que freqüentemente surge em relação à natureza da eutanásia é se ela é exclusivamente um ato médico ou não. Se os fatores decisivos na definição da eutanásia são o resultado (morte provocada, eliminação da dor) e a motivação (compaixão), a palavra pode continuar tendo uma conotação bastante ampla. Nesta acepção da palavra, o ato de um marido atirar e matar sua esposa que está morrendo de câncer, porque não agüenta mais ouvir suas súplicas para acabar com tanto sofrimento, poderia ser caracterizado como eutanásia. Se, porém, se acrescenta outro fator, a natureza do ato e a eutanásia for definida como ato de natureza médica, de repente a situação descrita não é mais eutanásica. Já que é o uso que consagra o sentido das palavras, minha sugestão é que o ato descrito seja caracterizado como homicídio por misericórdia ou, quando muito, suicídio assistido, dependendo da participação da vítima no processo. Mais ainda, proponho que se reserve a palavra eutanásia exclusivamente para denotar atos médicos que, motivados por compaixão, provocam precoce e diretamente a morte a fim de eliminar a dor.
Acolhida ou não esta sugestão, é importante, na análise de casos concretos, notar a diferença entre um homicídio por misericórdia, culposo ou não, praticado por um parente ou amigo, e um ato médico que mata intencionalmente o doente a fim de aliviar sua dor.
Independentemente desta discussão sobre a abrangência do termo, a eutanásia como ato médico merece ainda um pequeno comentário. Do ponto de vista ético, é importante distinguir entre eutanásia praticada em pessoas que estão sofrendo física ou psicologicamente, mas cuja condição não é tal que ameace imediatamente a vida (lifethreatening), e pessoas cuja enfermidade já entrou numa fase terminal, com sinais de comprometimento progressivo de múltiplos órgãos. Em ambos os casos, seria empobrecer muito a discussão reduzir a problemática ética à simples questão de autonomia e ao direito da pessoa decidir se quer continuar vivendo ou não. Mesmo na perspectiva da ética de princípios, além da autonomia, é preciso levar em conta os princípios da beneficência, da não-maleficência e da justiça. Se alargarmos mais ainda o horizonte para dialogarmos com as perspectivas da ética baseada num positivismo jurídico ou da ética da virtude, novas indagações e novas respostas aparecerão. Diante desta realidade do pluralismo ético, um conceito adequado de saúde pode ajudar a redimensionar a questão de conflito entre valores e procedimentos e oferecer outras pistas a não ser a morte precoce da pessoa.
Analisando, especificamente, o caso da pessoa que está sofrendo física ou psicologicamente, mas cuja condição não ameaça imediatamente sua vida, podemos tecer as seguintes considerações. É perfeitamente compreensível que uma pessoa tetraplégica, consciente, lúcida e angustiada peça a morte para pôr fim ao seu sofrimento. Se a saúde significa a ausência de doença e de enfermidades incapacitantes e se a autonomia significa que a pessoa tem liberdade de morrer quando e como quiser, faltando outros elementos é difícil encontrar argumentos para negar este pedido. Se, porém, a saúde tem outra conotação e se a autonomia se enquadra numa rede de sentidos e não é um critério de ação isolado, opções alternativas podem ser cogitadas. Na situação onde se define a saúde como ausência de doença ou de incapacidade psicomotora, não existe muito sentido falar da saúde do doente tetraplégico com pouca perspectiva de cura. Quando, porém, se entende a saúde como o bem-estar físico, mental, social e espiritual da pessoa, abre-se todo um leque de possibilidades para falar na saúde do doente crônico e para promover seu bem-estar. O bem-estar físico da pessoa tetraplégica se promove, em primeiro lugar, cuidando de sua higiene, conforto e tratando infecções ou moléstias que possam pôr em risco sua vida. Um quarto limpo, com cores alegres e temperatura agradável, onde não apenas o doente mas também os outros que entram se sentem à vontade, contribui muito. Não basta, porém, cuidar apenas do bem-estar físico. A promoção do bem-estar mental é de fundamental importância para poder descobrir junto com o doente, exercitando justamente uma autonomia co-responsável, outras saídas para lidar com sua situação a não ser a morte precoce. A reconquista de autoestima e a descoberta das possibilidades existenciais dentro das novas limitações impostas pela sua condição física são todos caminhos para promover não apenas o bem-estar mental do doente mas, também, no sentido amplo do termo, sua saúde. A reconquista da auto-estima acontece, de modo especial, no mundo das relações humanas e é difícil divorciar a promoção do bem-estar mental da promoção do bem-estar social. Isolamento da convivência com pessoas significativas é uma das grandes fontes de miséria para o doente crônico. Reverter este isolamento, recriando redes de relacionamento e construindo novo sentido para viver é um caminho alternativo que leva o doente a esquecer seu pedido de morte e a investir novamente na vida. Nesta fase de construção de novos sentidos, a preocupação com o bem-estar espiritual pode ser um fator decisivo na promoção da saúde global da pessoa.
À luz desta reflexão, pode-se argumentar que nesta situação onde a angústia é provocada por uma condição que não ameaça diretamente a vida, a eutanásia é um procedimento inapropriado do ponto de vista da ética. O que a situação requer não é investimento na morte mas, sim, investimento no resgate da vida e do seu sentido. No caso onde a terminalidade já se instalou e o comprometimento irreversível do organismo está em fase avançada, novamente o conceito de saúde com que se trabalha é decisivo para poder dialogar com a proposta eutanásica. Enquanto no caso anterior o procedimento apropriado foi investir na vida, neste caso o procedimento apropriado é investir na morte. A questão é, que tipo de morte? Se a saúde significa a ausência de doença e se o doente está com dores atrozes e numa situação onde não há mínimas condições de efetuar uma cura, parece não ter sentido falar da saúde do paciente terminal e a eutanásia pode se apresentar como uma proposta razoável. Se, porém, se entende a saúde como o bem-estar físico, mental, social e espiritual da pessoa podemos começar a pensar não apenas na saúde do doente crônico mas, também, em termos da saúde do doente em fase avançada da sua doença e com índices claros de terminalidade. Nesta perspectiva, a promoção do bem-estar físico do doente terminal, claro, não consiste na sua cura, mas nos cuidados necessários para assegurar seu conforto e o controle da sua dor. Garantir este bem-estar físico é um primeiro passo para manter sua saúde enquanto morre. Mas bem-estar físico apenas não basta. Muitas vezes, é o mal-estar mental que leva o doente terminal a pedir a morte antes da hora. Por isso, uma estratégia importante para permitir a pessoa repensar seu pedido de eutanásia é ajudá-la a recriar seu equilíbrio e bem-estar mental.
O sentir-se bem mental e emocionalmente é componente fundamental na saúde do doente terminal. Da mesma forma, o bem-estar social e espiritual agregam às outras formas de bem-estar uma condição que permita à pessoa aguardar com tranqüilidade a morte e viver plenamente dentro de suas possibilidades enquanto ela não vem.
Para concluir esta parte da nossa reflexão sobre a eutanásia e os dilemas éticos que levanta, precisamos distinguir entre o valor moral, considerado objetivamente, que se pode atribuir a um ato eutanásico e a culpa ética ou jurídica que se pode atribuir num determinado caso. Trabalhando com a definição de eutanásia que nós mesmos propomos: atos médicos que, motivados por compaixão, provocam precoce e diretamente a morte a fim de eliminar a dor,precisamos traçar alguns parâmetros para a valoração da eutanásia em casos concretos. Na tradição jurídica ocidental e na tradição da ética médica codificada e da teologia moral não há dúvida que a eutanásia, nos termos traçados, é considerada objetivamente como sendo um mal. Isto não significa, porém, que estas tradições desconsiderem o elemento subjetivo e tratem uniformemente todos os casos onde há homicídio por misericórdia ou onde há eutanásia no sentido mais restrito por nós proposto. As distinções que existem no direito entre crime e pena e na teologia moral entre o mal, o pecado e a culpa podem ajudar nos casos concretos onde a pessoa pratica o que é objetivamente um mal, segundo os critérios dos sistemas jurídicos e éticos, mas onde ela considera que está procedendo corretamente. Em relação à problemática jurídica, um sistema de leis pode, perfeitamente, continuar acenando no sentido de que a eutanásia é um mal objetivo, prejudicial à sociedade, caracterizando-a como crime e, ao mesmo tempo, incorporar na legislação mecanismos pelos quais não se prevêem penas para pessoas que praticam tais
actos movidas por fortes emoções, como, por exemplo, compaixão diante de grande sofrimento, ou por retas intenções, como, por exemplo, aliviar a dor. O ato continua sendo crime, mas as pessoas que o praticam, em determinadas circunstâncias especificadas, não são punidas, não porque a eutanásia em si não seja um mal, mas porque outros fatores entram na elaboração do juízo ético-jurídico. Na teologia moral, algo semelhante existe na distinção que se faz entre o mal objetivo e o pecado, entre a maldade praticada e a culpa pessoal. Para caracterizar um pecado grave não basta uma pessoa cometer um ato objetivamente mal, como matar uma pessoa inocente. Precisa, também, ter conhecimento claro e pleno que aquilo que se faz está errado e ter plena liberdade para agir. Em relação à eutanásia, em determinados casos é possível juntar estes três elementos: matéria grave, clara consciência e plena liberdade; nesta circunstância, o ato eutanásico seria um pecado. Porém, no dia-a-dia dos doentes terminais, quando se praticam atos eutanásicos, muitas vezes por causa das pressões emocionais, familiares ou sociais, faltam os elementos de clareza de consciência ou de liberdade. Nestes casos, o próprio documento do Vaticano que versa sobre a eutanásia (de 1980) reconhece que pode haver diminuição ou até ausência total de culpa.
É pouco provável que os comportamentos que acabamos de caracterizar como mistanásia tenham seus defensores do ponto de vista da ética, mas a eutanásia, para muita gente, continua uma questão aberta. É justamente por isso que queremos examinar a eutanásia levando em consideração o resultado que provoca, a intenção ou motivação que se tem para praticar o ato, a natureza do ato e as circunstâncias. Também, precisamos distinguir entre o valor moral, considerado objetivamente, que se pode atribuir a um ato eutanásico e a culpa ética ou jurídica que se pode atribuir num determinado caso.
Uma das grandes diferenças entre a mistanásia e a eutanásia é o resultado. Enquanto a mistanásia provoca a morte antes da hora – de uma maneira dolorosa e miserável –, a eutanásia provoca a morte antes da hora de uma maneira suave e sem dor. É justamente este resultado que torna a eutanásia tão atraente para tantas pessoas. A grande preocupação dos partidários da eutanásia é justamente tirar da morte o sofrimento e a dor e a grande crítica que eles fazem aos que rejeitam a eutanásia é que estes são desumanos, dispostos a sacrificar seres humanos no altar de sistemas morais autoritários que valorizam mais princípios frios e restritivos que a autonomia das pessoas e a liberdade que as dignificam.
Não há dúvida que, aqui, existem elementos éticos de peso: o direito do doente crônico ou terminal ter sua dor tratada e, quando possível, aliviada; a preocupação em salvaguardar, ao máximo, a autonomia da pessoa e sua dignidade na presença de enfermidades que provocam dependência progressiva e a perda de controle sobre a vida e sobre as funções biológicas; e o próprio sentido que se dá ao fim da vida e à morte.
Resta, porém, a questão: se a eutanásia é tão desejável como seus defensores afirmam, por que há tanta resistência, durante tanto tempo, por parte da ética médica codificada e por parte da teologia moral?
Pelo menos uma parte da resposta reside no próprio resultado que a eutanásia traz. O grande objetivo é proteger a dignidade da pessoa, eliminando o sofrimento e a dor. A dificuldade, do ponto de vista da ética médica codificada e da teologia moral, é que, na eutanásia, se elimina a dor eliminando o portador da dor. O Código de Deontologia Médica de 1931 expressa bem este dilema no seu artigo 16. Primeiro, afirma que “o médico não aconselhará nem praticará, em caso algum, a eutanásia”. Em seguida, afirma que o médico tem o direito e o dever de aliviar o sofrimento, “mas esse alívio não pode ser levado ao extremo de dar a morte por piedade”. A postura adotada é sedar, sim; matar, não. A partir do Código de Deontologia Médica de 1945 (artigo 4º. 5) os códigos brasileiros de ética médica não mais utilizam o termo eutanásia, porém a reprovação da morte proposital por mão de médico permanece firme.
No atual Código, de 1988, o artigo 6º dá continuidade a esta tradição afirmando claramente a preocupação com o valor da vida humana quando diz: “O médico deve guardar absoluto respeito pela vida humana, atuando sempre em benefício do paciente. Jamais utilizará seus conhecimentos para gerar sofrimento físico ou moral, para o extermínio do ser humano ou para permitir e acobertar tentativa contra sua dignidade e integridade”. Esta formulação vai muito além de qualquer concepção biologista do ser humano, afirmando que o tratamento deve ser em benefício do paciente, que não se deve usar a medicina para gerar sofrimento, nem para ofender a dignidade e integridade das pessoas e, menos ainda, para o extermínio do ser humano.
Como complemento desta afirmação de princípios, dentro da grande tradição da benignidade humanitária, o Código veda ao médico: “Utilizar, em qualquer caso, meios destinados a abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu responsável legal” (artigo 66).
A moral católica, nos seus textos oficiais, adota uma postura semelhante quando declara moralmente reprovável a eutanásia, entendida como “uma ação ou omissão que, por sua natureza ou nas intenções, provoca a morte a fim de eliminar toda a dor”. Esta afirmação da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé é reforçada pelas palavras do Papa João Paulo II,
na sua Carta Encíclica Evangelium Vitae n° 65, quando confirma que “a eutanásia é uma violação grave da lei de Deus, enquanto morte deliberada, moralmente inaceitável de uma pessoa humana”.
Resumindo, podemos perceber no resultado da eutanásia dois elementos: a eliminação da dor e a morte do portador da dor como meio para alcançar este fim. A ética médica codificada e a teologia moral acolhem o primeiro elemento, o tratamento e a eliminação da dor, e recusam o segundo elemento, a morte direta e proposital do portador da dor. Quando se condena a eutanásia, não é o controle da dor, nem a defesa da dignidade da pessoa humana doente ou moribunda que se condena, mas, sim, aquela parte do resultado que acaba matando a pessoa a fim de matar sua dor. O desafio é como defender e promover os valores positivos da eutanásia (quem não queria uma boa morte, suave e sem dor?) sem cair no extremo de matar a pessoa depositária da dignidade humana que fundamenta todos os outros direitos.
Outra grande diferença entre a mistanásia e a eutanásia é a intenção ou motivação que se tem para praticar o ato. Em certas formas de mistanásia, especialmente por má prática, existe a intenção de usar a medicina para prejudicar o doente crônico ou terminal, retirando vantagem desta situação. Para um comportamento se caracterizar como eutanásia, porém, é importante que a motivação e a intenção visem beneficiar o doente. Apressar o óbito de um doente terminal com a intenção de ganhar mais rapidamente a herança seria mistanásia, se não simplesmente assassinato. Apressar o óbito deste mesmo doente terminal, motivado por compaixão e com a intenção de mitigar seu sofrimento, seria eutanásia. Boas intenções não levam, necessariamente, a bons resultados. Compaixão por aquele que sofre é, sem dúvida, um sentimento que enobrece a pessoa. Quando esta compaixão tem como resultado o alívio da dor e a criação de estruturas de apoio que melhorem o bem-estar do doente terminal, estamos diante de uma postura eticamente louvável. Quando, porém, esta compaixão leva a um ato médico que diretamente mata o paciente, acaba-se tirando da pessoa não apenas a possibilidade de sentir dor mas, também, qualquer outra possibilidade existencial.
Na administração de analgésicos aos pacientes em fase avançada da sua doença, a questão de intenção pode assumir uma importância muito grande na avaliação ética do procedimento. Quando, por compaixão, se aplica o analgésico com a finalidade de abreviar a vida, estamos diante de um caso de eutanásia. Quando, porém, se aplica o analgésico com a finalidade de aliviar a dor e mitigar o sofrimento, em doses não-letais, mesmo se com isso pode haver como efeito colateral um certo encurtamento da vida, estamos diante de uma situação diferente. No primeiro caso, um ato tem como seu principal efeito algo mau (matar diretamente alguém) e um efeito secundário bom (eliminar a dor), enquanto no segundo caso o ato tem como seu principal efeito algo bom (eliminar a dor) e um efeito secundário mau (indiretamente, apressar a morte de alguém). No segundo caso, pode-se ver que a diferença reside precisamente na intenção: fazer o bem, aliviando a dor; e na natureza do ato que também é bom: sedar para promover o bem-estar do paciente. O procedimento se justifica pelo princípio do duplo efeito pelo qual se pode fazer algo bom (sedar), com intenção reta (aliviar a dor), mesmo se isso tiver um efeito secundário negativo (apressar o processo de morrer num caso onde a terminalidade irreversivelmente se instalou).
A distinção entre ação direta e resultados secundários aqui percebida não pode ser transformada em critério de aplicação mecânica, mas pode ser de grande utilidade mais adiante, na discussão sobre a distanásia e o sentido de prolongar indefinidamente a vida humana em certas circunstâncias. Para ajudar na clarificação terminológica, nesta fase da discussão, sugerimos que o termo eutanásia seja reservado apenas para a ação ou omissão que, por compaixão, abrevia diretamente a vida do paciente com a intenção de eliminar a dor e que outros procedimentos sejam identificados como sendo expressões de mistanásia, distanásia ou ortotanásia, conforme seus resultados, intencionalidade, natureza e circunstâncias. Dentro desta perspectiva que estamos desenvolvendo, ainda falta considerar um pouco mais a fundo a natureza do ato eutanásico e as circunstâncias em que se realiza. Uma ambigüidade que freqüentemente surge em relação à natureza da eutanásia é se ela é exclusivamente um ato médico ou não. Se os fatores decisivos na definição da eutanásia são o resultado (morte provocada, eliminação da dor) e a motivação (compaixão), a palavra pode continuar tendo uma conotação bastante ampla. Nesta acepção da palavra, o ato de um marido atirar e matar sua esposa que está morrendo de câncer, porque não agüenta mais ouvir suas súplicas para acabar com tanto sofrimento, poderia ser caracterizado como eutanásia. Se, porém, se acrescenta outro fator, a natureza do ato e a eutanásia for definida como ato de natureza médica, de repente a situação descrita não é mais eutanásica. Já que é o uso que consagra o sentido das palavras, minha sugestão é que o ato descrito seja caracterizado como homicídio por misericórdia ou, quando muito, suicídio assistido, dependendo da participação da vítima no processo. Mais ainda, proponho que se reserve a palavra eutanásia exclusivamente para denotar atos médicos que, motivados por compaixão, provocam precoce e diretamente a morte a fim de eliminar a dor.
Acolhida ou não esta sugestão, é importante, na análise de casos concretos, notar a diferença entre um homicídio por misericórdia, culposo ou não, praticado por um parente ou amigo, e um ato médico que mata intencionalmente o doente a fim de aliviar sua dor.
Independentemente desta discussão sobre a abrangência do termo, a eutanásia como ato médico merece ainda um pequeno comentário. Do ponto de vista ético, é importante distinguir entre eutanásia praticada em pessoas que estão sofrendo física ou psicologicamente, mas cuja condição não é tal que ameace imediatamente a vida (lifethreatening), e pessoas cuja enfermidade já entrou numa fase terminal, com sinais de comprometimento progressivo de múltiplos órgãos. Em ambos os casos, seria empobrecer muito a discussão reduzir a problemática ética à simples questão de autonomia e ao direito da pessoa decidir se quer continuar vivendo ou não. Mesmo na perspectiva da ética de princípios, além da autonomia, é preciso levar em conta os princípios da beneficência, da não-maleficência e da justiça. Se alargarmos mais ainda o horizonte para dialogarmos com as perspectivas da ética baseada num positivismo jurídico ou da ética da virtude, novas indagações e novas respostas aparecerão. Diante desta realidade do pluralismo ético, um conceito adequado de saúde pode ajudar a redimensionar a questão de conflito entre valores e procedimentos e oferecer outras pistas a não ser a morte precoce da pessoa.
Analisando, especificamente, o caso da pessoa que está sofrendo física ou psicologicamente, mas cuja condição não ameaça imediatamente sua vida, podemos tecer as seguintes considerações. É perfeitamente compreensível que uma pessoa tetraplégica, consciente, lúcida e angustiada peça a morte para pôr fim ao seu sofrimento. Se a saúde significa a ausência de doença e de enfermidades incapacitantes e se a autonomia significa que a pessoa tem liberdade de morrer quando e como quiser, faltando outros elementos é difícil encontrar argumentos para negar este pedido. Se, porém, a saúde tem outra conotação e se a autonomia se enquadra numa rede de sentidos e não é um critério de ação isolado, opções alternativas podem ser cogitadas. Na situação onde se define a saúde como ausência de doença ou de incapacidade psicomotora, não existe muito sentido falar da saúde do doente tetraplégico com pouca perspectiva de cura. Quando, porém, se entende a saúde como o bem-estar físico, mental, social e espiritual da pessoa, abre-se todo um leque de possibilidades para falar na saúde do doente crônico e para promover seu bem-estar. O bem-estar físico da pessoa tetraplégica se promove, em primeiro lugar, cuidando de sua higiene, conforto e tratando infecções ou moléstias que possam pôr em risco sua vida. Um quarto limpo, com cores alegres e temperatura agradável, onde não apenas o doente mas também os outros que entram se sentem à vontade, contribui muito. Não basta, porém, cuidar apenas do bem-estar físico. A promoção do bem-estar mental é de fundamental importância para poder descobrir junto com o doente, exercitando justamente uma autonomia co-responsável, outras saídas para lidar com sua situação a não ser a morte precoce. A reconquista de autoestima e a descoberta das possibilidades existenciais dentro das novas limitações impostas pela sua condição física são todos caminhos para promover não apenas o bem-estar mental do doente mas, também, no sentido amplo do termo, sua saúde. A reconquista da auto-estima acontece, de modo especial, no mundo das relações humanas e é difícil divorciar a promoção do bem-estar mental da promoção do bem-estar social. Isolamento da convivência com pessoas significativas é uma das grandes fontes de miséria para o doente crônico. Reverter este isolamento, recriando redes de relacionamento e construindo novo sentido para viver é um caminho alternativo que leva o doente a esquecer seu pedido de morte e a investir novamente na vida. Nesta fase de construção de novos sentidos, a preocupação com o bem-estar espiritual pode ser um fator decisivo na promoção da saúde global da pessoa.
À luz desta reflexão, pode-se argumentar que nesta situação onde a angústia é provocada por uma condição que não ameaça diretamente a vida, a eutanásia é um procedimento inapropriado do ponto de vista da ética. O que a situação requer não é investimento na morte mas, sim, investimento no resgate da vida e do seu sentido. No caso onde a terminalidade já se instalou e o comprometimento irreversível do organismo está em fase avançada, novamente o conceito de saúde com que se trabalha é decisivo para poder dialogar com a proposta eutanásica. Enquanto no caso anterior o procedimento apropriado foi investir na vida, neste caso o procedimento apropriado é investir na morte. A questão é, que tipo de morte? Se a saúde significa a ausência de doença e se o doente está com dores atrozes e numa situação onde não há mínimas condições de efetuar uma cura, parece não ter sentido falar da saúde do paciente terminal e a eutanásia pode se apresentar como uma proposta razoável. Se, porém, se entende a saúde como o bem-estar físico, mental, social e espiritual da pessoa podemos começar a pensar não apenas na saúde do doente crônico mas, também, em termos da saúde do doente em fase avançada da sua doença e com índices claros de terminalidade. Nesta perspectiva, a promoção do bem-estar físico do doente terminal, claro, não consiste na sua cura, mas nos cuidados necessários para assegurar seu conforto e o controle da sua dor. Garantir este bem-estar físico é um primeiro passo para manter sua saúde enquanto morre. Mas bem-estar físico apenas não basta. Muitas vezes, é o mal-estar mental que leva o doente terminal a pedir a morte antes da hora. Por isso, uma estratégia importante para permitir a pessoa repensar seu pedido de eutanásia é ajudá-la a recriar seu equilíbrio e bem-estar mental.
O sentir-se bem mental e emocionalmente é componente fundamental na saúde do doente terminal. Da mesma forma, o bem-estar social e espiritual agregam às outras formas de bem-estar uma condição que permita à pessoa aguardar com tranqüilidade a morte e viver plenamente dentro de suas possibilidades enquanto ela não vem.
Para concluir esta parte da nossa reflexão sobre a eutanásia e os dilemas éticos que levanta, precisamos distinguir entre o valor moral, considerado objetivamente, que se pode atribuir a um ato eutanásico e a culpa ética ou jurídica que se pode atribuir num determinado caso. Trabalhando com a definição de eutanásia que nós mesmos propomos: atos médicos que, motivados por compaixão, provocam precoce e diretamente a morte a fim de eliminar a dor,precisamos traçar alguns parâmetros para a valoração da eutanásia em casos concretos. Na tradição jurídica ocidental e na tradição da ética médica codificada e da teologia moral não há dúvida que a eutanásia, nos termos traçados, é considerada objetivamente como sendo um mal. Isto não significa, porém, que estas tradições desconsiderem o elemento subjetivo e tratem uniformemente todos os casos onde há homicídio por misericórdia ou onde há eutanásia no sentido mais restrito por nós proposto. As distinções que existem no direito entre crime e pena e na teologia moral entre o mal, o pecado e a culpa podem ajudar nos casos concretos onde a pessoa pratica o que é objetivamente um mal, segundo os critérios dos sistemas jurídicos e éticos, mas onde ela considera que está procedendo corretamente. Em relação à problemática jurídica, um sistema de leis pode, perfeitamente, continuar acenando no sentido de que a eutanásia é um mal objetivo, prejudicial à sociedade, caracterizando-a como crime e, ao mesmo tempo, incorporar na legislação mecanismos pelos quais não se prevêem penas para pessoas que praticam tais
actos movidas por fortes emoções, como, por exemplo, compaixão diante de grande sofrimento, ou por retas intenções, como, por exemplo, aliviar a dor. O ato continua sendo crime, mas as pessoas que o praticam, em determinadas circunstâncias especificadas, não são punidas, não porque a eutanásia em si não seja um mal, mas porque outros fatores entram na elaboração do juízo ético-jurídico. Na teologia moral, algo semelhante existe na distinção que se faz entre o mal objetivo e o pecado, entre a maldade praticada e a culpa pessoal. Para caracterizar um pecado grave não basta uma pessoa cometer um ato objetivamente mal, como matar uma pessoa inocente. Precisa, também, ter conhecimento claro e pleno que aquilo que se faz está errado e ter plena liberdade para agir. Em relação à eutanásia, em determinados casos é possível juntar estes três elementos: matéria grave, clara consciência e plena liberdade; nesta circunstância, o ato eutanásico seria um pecado. Porém, no dia-a-dia dos doentes terminais, quando se praticam atos eutanásicos, muitas vezes por causa das pressões emocionais, familiares ou sociais, faltam os elementos de clareza de consciência ou de liberdade. Nestes casos, o próprio documento do Vaticano que versa sobre a eutanásia (de 1980) reconhece que pode haver diminuição ou até ausência total de culpa.
Leonard Martin,
in Iniciação à Bioética,
Organização: Sérgio Ibiapina Ferreira Costa, Volnei Garrafa, Gabriel Oselka
Conselho Federal de Medicina – Brasília
in Iniciação à Bioética,
Organização: Sérgio Ibiapina Ferreira Costa, Volnei Garrafa, Gabriel Oselka
Conselho Federal de Medicina – Brasília
Blogue em http://paginasdefilosofia.blogspot.com
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Um excerto muito interessante. Sem querer tomar posição sobre este tema, penso que é pertinente ter em conta o pensamento dos médicos ligados aos cuidados paliativos neste debate. Segundo estes médicos, os cuidados paliativos representam uma modalidade de cuidados aos doentes em estado avançado ou terminal de doença mortal, que visam preservar a sua dignidade, aliviar o seu sofrimento e promover o seu conforto. Trata-se de uma abordagem não exclusivamente iátrica, ou seja, centrada nas dimensões orgânicas da evolução da doença, mas propriamente terapêutica, isto é, atenta às diferentes “dimensões” do doente, inclusivamente as mais subjectivas e pessoais. Assim, este é colocado no centro dos cuidados de saúde e encarado como quem melhor está posicionado para saber o que é bom (dentro dos limites impostos pela doença) para si. Estes médicos entendem, a partir da sua experiência clínica, que os doentes terminais têm, as mais das vezes, mais receio de sofrer do que de morrer, pelo que advogam que o alívio do sofrimento através de uma abordagem paliativa reduziria a expressão insignificante os pedidos de eutanásia. Pedidos que ocorrem, afirmam, muito em função de uma abordagem médica orientada para a eficácia curativa em hospitais não preparados para cuidar, mas sobretudo apenas para curar, que provocam intenso e insuportável sofrimento. Por outro lado, estes profissionais de saúde consideram que o prolongamento fútil da vida, característico de uma medicina alamente tecnologizada, deve ser banido deste tipo de cuidados, que evitam prolongar a vida a todo o custo e assumem a morte como um fenómeno natural.
Como digo, não tomo posição; quis apenas trazer um elemento para um eventual debate.