Visto que a moral tem influência nas acções e nas afeições, segue-se que ela não pode provir da razão; com efeito a razão, por si só, conforme já provamos, nunca pode ter tal influência. A moral desperta as paixões e produz ou impede as acções. A razão por si só não tem qualquer poder neste domínio. Portanto as regras morais não são conclusão da nossa razão. (…)
A razão é a descoberta da verdade ou do erro. A verdade e o erro consistem no acordo ou desacordo quer com as relações reais de ideias, quer com a existência e os factos reais. Portanto tudo o que não é susceptível deste acordo ou desacordo não pode ser verdadeiro ou falso e jamais pode ser objecto da nossa razão. Ora é evidente que as nossas paixões, volições e acções não são susceptíveis de tal acordo ou desacordo, pois são factos e realidades originais, completos em si mesmos e sem implicarem referência a outras paixões, volições e acções. É portanto impossível declará-las verdadeiras ou falsas, contrárias ou conformes à razão. (…)
As distinções morais não têm pois origem na razão. A razão é completamente passiva e jamais pode ser fonte de um princípio tão activo como a consciência ou sentido moral.
David Hume, Tratado da natureza humana, tr. Serafim S. Fontes, Gulbenkian, pp. 529 – 531.
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