Antes de falar sobre esse tema, devo confessar que ele me divide e testa.
Não tenho opinião formada sobre esse assunto, venho apenas trazer opiniões
alheias, mesmo que cada um defenda seu ponto de vista.
Esse é um tema polêmico, duro, nauseante, cercado de ética, política,
moralismo, princípios religiosos, solidariedade e compaixão.
Não consigo, portanto, homogeneizar todas essas polemicas dentro de mim,
simples mortal observadora do comportamento alheio.
Mas a eutanásia nos estremece por dentro. Sempre haverá uma disputa velada
entre os homens e o Divino, entre o certo e o errado, entre a vontade de
um sobre a vida do outro, seja para defendê-la ou abrevia-la.
O caso Eluana é insano, li muito as declarações de seu pai, que durante
mais de 10 anos e 5000 paginas de processos, simplesmente defendia o seu
direito de pai sobre o direito dos médicos sobre a vida de sua filha. Foi
uma longa batalha.
Nós, médicos, hipocraticamente estamos subjugados ao compromisso de manter
a vida a qualquer custo, mesmo nos opondo a vontade de doentes e seus
familiares.
Eluana não voltaria jamais. Terri Schiavo, americana, também não. O que
diríamos sobre Hugo Claus, indicado ao Nobel e prisioneiro doente de
Alzheimer que morreu em março em um hospital de Antuérpia, que teve a sua
eutanásia permitida? É muito difícil expressarmos um valor de julgamento
sobre o que mais defendemos na vida: a própria vida.
Eutanásia (do grego ευθανασία – ευ “bom”, θάνατος “morte”) é o ato pelo
qual se abrevia a vida de um doente incurável de maneira controlada e
assistida por um especialista. Uma complicada questão de bioética e
biodireito, pois o Estado tem como lei máxima a proteção da vida dos seus
cidadãos.
Admitida na antiguidade, a eutanásia só foi condenada a partir do judaísmo
e do cristianismo, em cujos princípios a vida tinham o caráter sagrado.
Os Brâmanes eliminavam os velhos enfermos e os recém-nascidos defeituosos
por considerá-los imprestáveis aos interesses do grupo, os Espartanos
matavam os recém-nascidos deformados e até anciãos, pois espartanos
deveriam ter as máximas condições de robustez e força; e os Celtas tinham
por hábito que os filhos matassem os seus pais quando estes estivessem
velhos e doentes.
Existem 2 tipos de eutanasia : a ativa, que conta com atitudes que
objetivam o fim da vida de maneira planejada e negociada entre o doente (
ou seu representante legal )e o medico (ou outro profissional de saude
vinculado ao caso) ; e a passiva, que não provoca deliberadamente a morte,
mas interrompe todos os cuidados necessários para manutenção da vida em um
doente terminal ou irreversivel
A eutanásia não defende a morte, mas a escolha pela mesma por parte de
quem a concebe como melhor opção ou a única.
São muitos os argumentos sobre a eutanásia, desde os religiosos, éticos
até os políticos e sociais. Do ponto de vista religioso a eutanásia é tida
como uma usurpação do direito à vida humana…
As pessoas com doença crônica e, portanto, incurável, ou em estado
terminal, têm naturalmente momentos de desespero, momentos de um
sofrimento físico e psíquico e social muito intenso.
Os pedidos de Eutanásia por parte dos doentes são muitas vezes pedidos de
ajuda, implorações para que se pare o sofrimento!
No Brasil a eutanásia é considerada homicídio, já na Holanda é permitida
por lei e na Bélgica registrou se 705 casos da eutanásia durante o ano
passado, 42% a mais do que em 2007.
A discussão sobre a eutanásia é multifocal e leva a uma reflexão sobre o
significado da dignidade humana, seja no sentido de respeitar o direito de
viver, seja na oportunidade de respeitar o direito de morrer com
dignidade, a partir do instante que a morte é justa.
Na medicina avançamos na possibilidade de salvar mais vidas, e criamos
automaticamente complexos dilemas éticos que permitem maiores dificuldades
para um conceito mais ajustado do fim da existência humana. O aumento da
eficácia e a segurança das novos tratamentos motivam questionamentos
quanto aos aspectos econômicos, éticos e legais resultantes do emprego
exagerado de tais medidas e das suas possíveis indicações inadequadas.
O atual Código Penal, não especifica o crime da eutanásia. O médico que a
pratica comete crime de homicídio simples, tipificado no artigo 121, com
pena de 6 a 20 anos de reclusão.
Nem a lei nem a ética médica exigem que “tudo seja feito” para manter uma
pessoa viva. A insistência, contra o desejo do paciente, em adiar a morte
com todos os meios disponíveis não é prática corrente nos hospitais. Seria
algo cruel e desumano. A morte é algo de natural e não se justifica a sua
recusa absoluta. Há um momento a partir do qual as tentativas de curar
podem deixar de demonstrar compaixão ou de fazer sentido sob o ponto de
vista médico. O esforço deve ser posto em tornar o tempo de vida que reste
ao doente o melhor possível. A intervenção médica pode-se limitar a
aliviar a dor e outros sintomas de sofrimento
Enfim, esse é um tema amargo. Mas altamente reflexivo que pelo menos nos
faz enxergar melhor o sofrimento do outro.
A solidariedade médica é quase um ato obrigatório e humanizado. Mesmo sob
as polemicas questões entre a vida e a morte.