Aos nossos avós, os objectos, as pessoas, os acontecimentos apresentavam-se como algo para ser sentido, para ser vivido como uma experiência interior, causa de alegria ou dor, objecto de participação sensorial, emotiva, espiritual, ou, pelo contrário, algo de que não se apercebiam ou que se recusavam a perceber. A nós, pelo contrário, os objectos, as pessoas, os acontecimentos apresentam-se como algo já sentido, que vem ocupar-nos com uma tonalidade sensorial, emotiva, espiritual já determinada. Na verdade, não é entre a participação emotiva e a indiferença que reside a distinção, mas entre o que está por sentir e o já sentido.
Mário Perniola, Do sentir, tr. António Guerreiro, Ed. Presença, p. 12.
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Os objectos nunca se me apresentam como algo já sentido, mas como algo por sentir. Daí não concordar de todo com o que é afirmado no texto – que não passa de um simplismo ingénuo.
Acho que gostará de ler Perniola, pois ele coloca-se do lado do «por sentir» e critica a sociedade pós 60 de viver no já sentido.
Também não concordo que hoje a forma como percepcionamos o que está ou acontece fora de nós, se faça de uma forma diferente do que se fazia há 100 anos. As coisas acontecem é muito mais rapidamente hoje de que há 100 anos.
Se não for explicado mais nada parece-me uma ideia peregrina.
Para Perniola não é só a velocidade/quantidade da percepção que é diferente, é a qualidade do sentir que mudou. E estende a afirmação dessa mudança para o campo do comportamento/acção humana e portanto da filosofia política.
Estou a descobrir o livro em que o autor expõe estas ideias que foi publicado originalmente em 91, portanto estas reflexões datam da última metade da década de 80 (digo eu sem certeza nenhuma, mas contextualizar a reflexão por vezes ajuda a entender porque se pensa e se diz determinadas coisas.)
Talvez a velocidade e quantidade da percepção mude a qualidade do sentir.