A nossa espécie, o homem no sentido mais amplo, conseguiu sobreviver e multiplicar-se principalmente pelo aperfeiçoamento do seu equipamento. Tal como ocorre com outros animais, é sobretudo por meio do seu equipamento que o homem actua sobre o mundo exterior e reage em função dele, obtém o seu sustento e escapa aos perigos – em linguagem técnica, adapta-se ao meio ou mesmo ajusta o meio às suas necessidades. O equipamento do homem, porém, difere significativamente dos recursos utilizados pelos outros animais, que os transportam em si mesmos, como parte do corpo. O coelho tem patas adequadas para cavar, o leão tem garras e dentes para estraçalhar a sua caça, o castor tem presas agudas, a maioria dos animais têm pêlos ou cabelos que os mantêm aquecidos – a tartaruga carrega até mesmo a casa às costas. O homem não dispõe de quase nenhum equipamento desse género, e perde mesmo até alguns de tais recursos, que lhe eram naturais nas épocas pré-históricas. Foram substituídos por instrumentos, órgãos não corporais que fabrica, utiliza e despreza, segundo as suas conveniências. Faz picaretas e pás para cavar, armas para matar a caça e o inimigo, enxós e machados para cortar a madeira, roupas para manter-se aquecido no frio, casas de madeira, tijolo ou pedra, para abrigar-se. Os “homens” realmente muito primitivos tinham dentes caninos alongados em mandíbulas maciças que poderiam servir de arma bem perigosa. Esses caninos, porém, desapareceram no homem moderno, cuja dentadura não causa feridas mortais.
Tal como nos outros animais, há decerto uma base fisiológica corporal para o equipamento do homem, e que pode ser resumida em duas palavras, mãos e cérebro. Dispensadas do trabalho de transportar o corpo, as nossas patas dianteiras transformaram-se em instrumentos delicados, capazes de uma surpreendente variedade de movimentos subtis e preciosos. Para controlá-los e colocá-los em relação com as impressões recebidas de fora pelos olhos e outros órgãos dos sentidos, tornamo-nos possuidores de um sistema nervoso complicado e de um cérebro excepcionalmente grande e complexo.
Tal como nos outros animais, há decerto uma base fisiológica corporal para o equipamento do homem, e que pode ser resumida em duas palavras, mãos e cérebro. Dispensadas do trabalho de transportar o corpo, as nossas patas dianteiras transformaram-se em instrumentos delicados, capazes de uma surpreendente variedade de movimentos subtis e preciosos. Para controlá-los e colocá-los em relação com as impressões recebidas de fora pelos olhos e outros órgãos dos sentidos, tornamo-nos possuidores de um sistema nervoso complicado e de um cérebro excepcionalmente grande e complexo.
O facto de ser transferível e extracorpóreo dá ao resto do equipamento humano vantagens evidentes. É mais adequado e mais adaptável do que o dos outros animais, cujos recursos só os tornam capazes de viver num meio determinado e sob condições especiais. (…)
Em resumo, o equipamento hereditário do animal é adequado à execução de um número limitado de operações, num determinado meio. O equipamento não corpóreo do homem pode ser ajustado a um número quase infinito de operações – “pode ser”, note-se, e não “é”.
V. Gordon, O Que Aconteceu na História,
Rio de Janeiro, Zahar, 1960, pp. 4-5
Rio de Janeiro, Zahar, 1960, pp. 4-5
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