«O que são valores? Dizemos
que os valores não existem por si
mesmos: necessitam de um depositário sobre o qual descansam.
Aparecem-nos, portanto, como meras qualidades desses depositários: beleza de um quadro, elegância de um vestido, utilidade de uma ferramenta.
Se observarmos o vestido, o quadro
ou a ferramenta, veremos que a qualidade valorativa é distinta das outras
qualidades. Nos objetos
mencionados há algumas qualidades que parecem essenciais para a própria
existência dos objetos, por
exemplo, a extensão. Mas o valor não
confere nem agrega ser, pois a pedra existia plenamente antes de ser talhada,
antes de se transformar num bem.
Enquanto as qualidades primárias não se podem eliminar dos objetos, bastam
uns golpes de martelo para
terminar com a utilidade de um instrumento ou a beleza de uma estátua. Antes de
incorporar-se no respetivo portador ou depositário, os valores são
meras «possibilidades», isto é, não têm
existência real, mas virtual.
Ver-se-á melhor a diferença se se comparar a beleza, que é um valor, com a ideia de beleza, que é um objeto ideal. Captamos a beleza primordialmente por via emocional, enquanto a ideia de beleza apreende-se por via intelectual.
Com o fim de distinguir os valores dos objetos ideais, afirma-se que estes são enquanto os valores não são, mas valem.
Uma característica fundamental dos valores é a polaridade. Enquanto as coisas são o que são, os valores apresentam-se desdobrados num valor positivo e o correspondente valor negativo. Assim, a beleza opõe-se à fealdade, o mal ao bem. A polaridade implica a rotura com a indiferença. Não há obra de arte que seja neutra, nem pessoa que se mantenha indiferente a escutar uma sinfonia, ler um poema ou ver um quadro.
Aliás, os valores estão ordenados hierarquicamente, isto é, há valores inferiores e superiores. É mais fácil afirmar a existência de uma ordem hierárquica do que indicar qual é essa ordem e quais são os critérios para a estabelecer.
Muitos são os axiólogos que têm enunciado uma tábua de valores, pretendendo que essa seja a «Tábua», mas a crítica mostra rapidamente os erros de tais tábuas e dos critérios usados na sua elaboração.
O homem, individualmente, bem como as comunidades e os grupos culturais concretos, manejam sempre uma tábua de valores. É certo que tais tábuas não são fixas, mas flutuantes, e nem sempre coerentes; porém, é indubitável que o nosso comportamento frente ao próximo, aos seus atos, às suas criações estéticas (…), é julgá-los e preferi-los de acordo com uma tábua de valores. Submeter essas tábuas de valores, que obscuramente influem na nossa conduta e nas nossas preferências, a um exame crítico é a tarefa a que o homem moderno não pode renunciar.»
Risieri Frondizi, Qué son los valores?
México: Fondo de Cultura Económica, 1958.