4.9 O mobile-learning
A digitalização progressiva do ensino não se manifesta apenas pelo abandono do papel e adopção de conteúdos e plataformas digitais em e-learning ou e-learning. Um conceito que tem vindo a desenvolver-se é o do mobile-learning, ou m-learning, dado que o custo dos aparelhos com os requisitos necessários a ambientes educativos virtuais tem vindo a baixar progressivamente. É o caso de smartphones e tablets, aparelhos a quem se dedicam as linhas seguintes, não descurando dispositivos menos comuns, como os e-readers e os iPods ou simples leitores mp3 e mp4.
O conceito m-learning remete para uma aprendizagem mediada por dispositivos móveis, tais como tablets ou smartphones, possibilitando que os utilizadores se encontrem em espaços geográficos muito distantes. A facilidade de acesso à informação e de comunicação com outras pessoas facilita as interações online e a colaboração entre alunos na resolução de tarefas escolares.
A utilização de tecnologias móveis tem várias vantagens: permite que o professor partilhe conteúdos com os seus alunos rapidamente, garante uma maior aproximação aos interesses dos alunos, já familiarizados com estes dispositivos, e alguns estudos (Moura, 2015) apontam para melhores resultados na aprendizagem. Contudo, também serão de esperar alguns aspetos negativos, tais como a distração na sala de aula e a necessidade de garantir a segurança digital, dada a possível ocorrência de fenómenos de cyberbullying.
O potencial educativo do m-learning é grande, mas será necessário determinar claramente quais as tecnologias e conteúdos que permitem melhores resultados, bem como ter em conta o acesso aos equipamentos e à rede de internet, além das competências dos utilizadores.
“A aprendizagem realizada através de dispositivos móveis será significativa tanto no e-learning como na aprendizagem tradicional. (…) Num futuro próximo, o m-learning tornar-se-á uma parte normal da educação de todos, porque acontece no contexto em que é preciso e é relevante para o utilizador.” (Moura, 2015)
Adelina Moura refere a existência de estudos que mostram que os estudantes do ensino superior, quando utilizam o m-learning sob a forma de podcasting, mostram-se bastante recetivos a esta ferramenta, e com maior economia de tempo para fazer revisões das matérias.
Dado que a distinção b-learning, m-learning ou e-learning é progressivamente mais ténue, doravante utilizaremos indistintamente a expressão e-learning sempre que formos referentes ao ensino online.
Existem muitas aplicações práticas para o e-learning. Por exemplo, enquanto professor na Escola Secundária Garcia de Orta desenvolvi um projeto de leitura digital, disponibilizando livros do Projeto de Leitura dos ensinos Básico e Secundário reunidos num mesmo espaço online[1] otimizado para a leitura em dispositivos móveis. O blogue permite aceder a dezenas de livros digitais, em domínio público, em formato pdf, e-pub, audiolivro ou vídeo. Da mesma forma, no site Páginas de Filosofia, existe uma secção reservada a livros digitais gratuitos[2]. O projeto Yoza[3], na África do Sul, entretanto fundido com o projeto FunDza[4] consistia precisamente na promoção da leitura e da escrita através de dispositivos móveis, obtendo uma redução de custos dados que o formato digital é, expectavelmente, mais barato que a aquisição de livros em papel. Convém esclarecer que o e-learning não se reduz a livros digitais, mas pode ser alargado a podcasts, áudio e vídeo, imagens, texto, plataformas e redes sociais, aplicações para dispositivos móveis, etc. Um exemplo da utilização de apps em dispositivos móveis para aprender algo é a aplicação Duolingo[5], que permite aprender várias línguas (Inglês, Espanhol, Francês, Alemão, Italiano, etc.) através de uma gamificação de conteúdos, disponibilizando cursos, soluções para escolas, aplicações para Android, iOS e Windows e redes sociais dedicadas à comunidade de aprendentes Duolingo. A ascensão súbita do e-learning está claramente relacionada com esta revolução em curso no acesso à informação. A informação tornou-se ubíqua numa sociedade móvel que está conectada em rede e interage coletivamente.
Note-se que o e-learning não pode consistir apenas na transformação do suporte tecnológico pelo qual se ensina ou aprende. Como afirma Geddes,
“O e-learning representa mais do que uma mera expansão das formas tradicionais de ensino. Assume-se como um processo de aprendizagem alternativo aos métodos tradicionais e assenta em métodos de instrução que promovem a autonomia e a melhoria do ensino à distância. Enquanto que, nos modelos tradicionais de ensino, a transferência de conhecimentos é dada entre professor e aluno, no e-learning o aluno participa ativamente no processo de aprendizagem para torná-lo num processo de construção que ocorre em qualquer momento e em qualquer lugar. Os estudantes podem personalizar a transferência e o acesso à informação, a fim de desenvolverem as suas competências satisfazendo os seus próprios objetivos educacionais. Para além disso, como o e-learning requer o uso de dispositivos móveis, a aprendizagem torna-se ainda mais aliciante e convidativa para todos os participantes. (Geddes, 2004)”
Consequentemente, além da tecnologia que suporta o e-learning, será necessário ter em conta os modelos pedagógicos de ensino a distância (e-learning) que permitem, favorecem, fundamentam teoricamente a utilização desta tecnologia. Não é a introdução dos dispositivos móveis, por si, que vai favorecer a aprendizagem; é a forma como se estruturam as matérias, as atividades, que dão sentido e conferem eficácia à aprendizagem a realizar pelos alunos.
Segundo Valentim (2009) ,
“antevê-se desde logo três tipos de aproveitamento das comunicações móveis: a) como sistemas de resposta em sala de aula (instrumentos de comunicação imediata de participantes (…), portanto como forma de aumentar a colaboração; b) enquanto facilitadores de simulações participativas (veículos emuladores da realidade, instrumento de modelagem pelo roleplay); c) para a recolha colaborativa de dados facilitadores da execução de tarefas (…)” (Valentim, 2009)
De facto, a utilização dos dispositivos móveis na sala de aula é variada:
- fazer sondagens, para conhecer a posição dos intervenientes em relação a vários assuntos, de forma rápida e visualmente atrativa (por exemplo, gerando um gráfico de votantes). É o caso da app NearPod[6].
- fazer questionários de escolha múltipla, com resultados automáticos, tornando o exercício num jogo, como no Kahoot[7];
- representação do conhecimento, como mapas de conceitos e as nuvens de palavras, como o Tagxedo[8];
- utilizar a realidade aumentada, com códigos QR[9], entre muitas outras.
Naturalmente, qualquer utilização do e-learning deverá revestir-se de alguns cuidados, conforme referido na extensa bibliografia sobre o assunto bem como os modelos pedagógicos subjacentes a cada atividade.
Como os modelos pedagógicos do e-learning, ou mais especificamente do e-learning, não constituem o objeto deste relatório, vejamos algumas aplicações práticas possíveis em filosofia.
- a) Oxford Dictionary of Philosophy
Por apenas €8,63, esta app oferece um dicionário de filosofia muito completo. A versão gratuita inclui publicidade. Diariamente é apresentado um conceito (por exemplo, “justificação”) e é possível interagir com “amigos”, constituindo uma rede social dentro do dicionário. Uma simples caixa de pesquisa permite aceder à palavra desejada e a outras, sugeridas pela aplicação, que são conceptualmente próximas. Cada conceito permite a partilha nas redes sociais ou noutros suportes (Facebook, Messenger, Google Drive, mensagens, GMail, WhatsApp, Bluetooth, hangouts, WeTransfer, …). O dicionário contém centenas de definições simples mas práticas para estudantes introdutórios de filosofia. Infelizmente, está apenas em inglês.
- b) Termos filosóficos[10]
Figura 16 App Termos filosóficos
Trata-se de um dicionário de filosofia elaborado em função dos conteúdos da Wikipedia[11] em português. Contém centenas de artigos, com a particularidade de dispor de um mecanismo de leitura automática, muito útil para alunos com dificuldades de visão. Tal como o anterior, permite a partilha por parte do utilizador. Contém hiperligações para outros artigos relacionados. É gratuito e permite a inserção de comentários partilháveis.
- c) Curso de Filosofia EaD
Trata-se de uma app que permite aceder às várias plataformas e serviços de um curso de Filosofia em modalidade de ensino a distância da Universidade Federal de Pelotas, no Brasil. A app permite aceder a vários conteúdos, como livros gratuitos, aulas, ofertas de emprego, um canal do Youtube, informações administrativas, serviços da Biblioteca da Universidade, redes sociais, um ambiente virtual de aprendizagem (Moodle), etc.
- d) Philosophie magazine[13]
Figura 18 Philosophie Magazine
Trata-se de uma app que permite aceder à revista Philosophie Magazine e ao seu histórico de edições. O acesso gratuito contém muitas limitações, mas na versão paga é possível subscrever a assinatura, partilhar com os amigos e aceder a um número elevado de revistas. Encontra-se em francês.
- e) Quiz filosófico
O Quiz filosófico é um exemplo típico da gamificação do ensino e da introdução da vertente social: o aluno “concorrente” tem de responder a questões de escolha múltipla sobre filosofia e pode desafiar outros “concorrentes” através da internet. A aplicação é muito simples mas didaticamente pouco relevante.
- f) SSF Filosofia
Trata-se de uma aplicação com um resumo da história da filosofia (por épocas) e com uma organização por problemas clássicos da filosofia. A aplicação é muito fácil de usar e visualmente atrativa. Só existe a versão em italiano.
- g) Dicionário Filosófico[16]
Figura 21 Dicionário Filosófico
O Dicionário filosófico encontra-se em português, mas a tradução é de má qualidade. Também os conteúdos são escassos e de fraca qualidade. O conceito é interessante e merece ser explorado competentemente.
- h) Filosofia[17]
Compilação de autores e fases da história da filosofia. Fácil de usar, muito intuitiva e informativa, mas sem referenciar fontes. Trata-se de uma síntese de correntes filosóficas.
- i) Filosofia Questionário
Tal como o nome indica, trata-se de um questionário filosófico, como se de um jogo se tratasse, com questões de escolha múltipla. Em inglês.
Figura 23 Filosofia Questionário
- j) AskPhil
AskPhil é uma app que permite navegar no famoso site com o mesmo nome[20]. As centenas de questões respondidas no site encontram-se aqui reunidas, com enorme facilidade de navegação. Em inglês.
- k) No Google Play é ainda possível encontrar centenas de livros digitais para download, como o Manual de Filosofia Política organizado por João Cardoso Rosas[21]. Ou “A Política em Tempos de Indignação”, de Daniel Innerarity[22]. Trata-se de uma fonte de recursos imensa e inestimável.
Existem centenas ou milhares de aplicações e livros dedicados à filosofia no universo das aplicações Android para tablets e smartphones. Diariamente surgem novas aplicações, livros digitais, jogos e filmes para dispositivos móveis que podem ser utilizados em educação, e especificamente no ensino da filosofia. A questão que se deve colocar, então, não é “o quê” mas “porquê”: é fácil encontrar estes suportes, estes meios e canais de comunicação e ensino, mas o fundamental é descobrir o porquê de se utilizarem estes recursos. A resposta encontra-se nas palavras de Pedroso:
“O trabalho colaborativo, a pesquisa, a leitura, a escrita, a criatividade, o trabalho de projeto e outras atividades de aprendizagem podem ser, hoje em dia, suportados pela utilização de ferramentas e aplicações que, tirando partido dos equipamentos e acessos disponíveis nas escolas, as transformam em verdadeiras “escolas do século XXI”. (Pedroso, 2015)
Podemos encontrar mais aplicações educativas para e-learning ou e-learning, em dois excelentes sites: o “Aprendiz de Investigador”[23] , um site com excelentes recursos para a literacia digital, e a página da ERTE[24]. Ambos apresentam extensos recursos utilizáveis em filosofia. O “Aprendiz de Investigador” contém mesmo tutoriais preciosos para qualquer professor ou aluno que queira aprender a trabalhar com ferramentas digitais.
[1] Blogue dos Livros, uma iniciativa da Biblioteca da Escola Secundária Garcia de Orta, disponível em https://bloguedoslivros.wordpress.com/
[2] A coleção completa encontra-se disponível numa plataforma Google drive, acessível a partir de http://www.paginasdefilosofia.net/documentos/estante/
[3] Projeto disponível em https://m4lit.wordpress.com/about-the-project/
[4] Cf. https://live.fundza.mobi/
[5] Cf. https://pt.duolingo.com/register
[8] Cf. http://www.tagxedo.com/
[9] Por exemplo, entre muitos outros, uma lista de atividades possíveis com QR codes em https://www.fractuslearning.com/2012/02/20/qr-codes-in-education/
[10] Cf. https://play.google.com/store/apps/details?id=com.do_apps.catalog_186&rdid=com.do_apps.catalog_186
[11] Sobre as possibilidades de utilização da Wikipedia para fins educativos, consulte-se http://repositorioaberto.uab.pt/handle/10400.2/3370
[13] Cf. https://play.google.com/store/apps/details?id=com.pressmatrix.philofrench&rdid=com.pressmatrix.philofrench
[16] Cf. https://play.google.com/store/apps/details?id=com.mobile21.diccionariofilosofico
[17] Cf. https://play.google.com/store/apps/details?id=com.andurin.filosofia
[20] Cf. http://www.askphilosophers.org/
[21] Cf. https://play.google.com/store/books/details/Jo%C3%A3o_Cardoso_Rosas_Manual_de_Filosofia_Pol%C3%ADtica?id=3ASxPgKMbE4C&hl=pt-PT
[22] Cf. https://play.google.com/store/books/details/Daniel_Innerarity_A_Pol%C3%ADtica_em_Tempos_de_Indigna%C3%A7?id=A-DyDAAAQBAJ&hl=pt-PT
[23] Cf. http://www.aprendizinvestigador.pt/recursos
[24] Cf. http://erte.dge.mec.pt/sites/default/files/Recursos/Estudos/apps_dispositivos_moveis2016.pdf