Procuro imaginar com que novos aspectos o despotismo poderá reaparecer no mundo: vejo uma multidão imensa de homens parecidos e de igual condição, que giram sem descanso à volta de si próprios em busca de prazeres insignificantes e vulgares com que enchem a alma; cada um, retirado do seu canto, ignora o destino de todos os outros; a espécie humana resume-se, para eles, aos filhos e aos amigos particulares; quanto aos seus outros concidadãos, estão ao seu lado mas nem os vê; toca-os e nem os sente; só existe em si próprio e para si próprio; ainda tem uma família, mas a Pátria já não existe para ele.
Acima desta vasta multidão, ergue-se um poder imenso e tutelar que se encarrega, sem a ajuda de ninguém, de organizar os divertimentos e os prazeres de todos, e de velar pelo seu destino. É um poder absoluto, pormenorizado, ordenado, previdente e doce. Seria semelhante ao poder paternal se, como este, tivesse como objectivo preparar os homens para a idade adulta; mas, pelo contrário, o seu objectivo é mantê-los irrevogavelmente na infância. (…) Ser-lhe-á possível poupar completamente aos homens o trabalho de pensar e a dificuldade de viver?
Tocqueville, Da democracia na América, Rés Editora, pp.410, 411.
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