Analítica, estética (ing. analytic aesthetics) Como é evidente pelo próprio nome; a estética analítica está ligada ao que foi definido como orientação analítica na filosofia contemporânea, iniciada por Moore e Russell e continuada por Wittgenstein, entre outros, através de várias fases, cedo caracterizadas como atomismo lógico, positivismo lógico, análise da linguagem corrente.
Ora, verificaram-se fundamentalmente dois modos de fazer a análise: um destinado a reduzir os conceitos ou factos aos seus componentes ou propriedades de base, o outro, pelo contrário, orientado simplesmente para a clarificação de noções vagas e problemáticas, no sentido da diferenciação dos diversos usos e dos vários matizes de significado de certos campos semânticos. Deste ponto de vista, não há dúvida que em estética se praticou sobretudo este segundo modo de análise, na senda das obras do último Wittgenstein, a partir dos anos cinquenta. Desta perspectiva, que se limita à clarificação dos conceitos da linguagem corrente, distingue-se uma linha mais propriamente crítico-construtivista, com base na filosofia de Carnap e que em estética se refere sobretudo à obra de Nelson Goodman (Linguaggi), nem sempre vista como pertencente à linha analítica. Os traços mais comuns que caracterizam as teorias estéticas dos autores de inspiração analítica (entre os quais podemos recordar M. Weitz, A. Isenberg, F.N. Sibley, S. Hampshire, W. Kennick, J.A. Passmore, W.B. Gallie) consistem no antiessencialismo e na procura de clareza. O alvo polémico da estética analítica é a pretensão da estética tradicional de impor uma unidade – que para os analistas não pode deixar de ser espúria e artificial – entre as diversas artes, por meio do emprego de termos de tal modo gerais que obstam toda a diferença a favor de fórmulas ocas, tais como «expressão», «forma», «beleza», «representação», etc. Desta forma, a estética analítica acabou por conceber-se a si própria fundamentalmente como disciplina aplicada, empenhada principalmente em clarificar e destacar os conceitos de arte e de crítica de arte. Como a filosofia analítica em geral, ao discutir os fundamentos lógicos e epistemológicos do conhecimento científico, se aplicou principalmente na clarificação dos conceitos da ciência, do mesmo modo se definiu a estética analítica como disciplina clarificadora dos conceitos usados pela crítica literária e artística, das quais se espera o estudo propriamente dito, sistemático e científico, das diferentes artes. A estética analítica, a partir dos anos cinquenta, e até à crise introduzida pelo pós-estruturalismo e pelo descontrucionismo, foi, no âmbito da filosofia anglo-saxónica, essencialmente uma metacrítica, ou seja, uma filosofia da crítica literária e artística, sem qualquer interesse por aquilo que se situa para além da linguagem e da sua intencionalidade. Uma característica ulterior da estética analítica, também ela relacionada com este seu carácter metacrítico, é a escassa atenção por ela prestada ao problema da avaliação e do valor da obra. Ao ignorar a dimensão valorativa, a estética analítica tentou definir-se como disciplina puramente descritiva e classificativa, capaz de conseguir resultados objectivos e científicos, prescindindo totalmente das determinações histórico-sociais da arte, e também de toda a referência mais ampla ao horizonte cultural em que a obra se situa. Tal corresponde ao registo a-histórico próprio da filosofia analítica no seu conjunto. Posto que a estética analítica se caracterizou por uma espécie de filosofia do exercício crítico, a sua crise a partir dos últimos decénios deve-se, em boa parte, precisamente à crise do cientismo na crítica e na teoria das artes. Justamente porque definira o seu projecto nos termos de uma descrição tendo subjacente a prática crítica, independentemente de toda a prescrição normativa, é que a estética analítica entrou em crise no momento em que se tomou manifesto não existir uma única lógica que subentenda o exercício da crítica. Esta crise levou, consequentemente, a estética analítica a orientar-se numa direcção mais programática e flexível, atenta à multiplicidade de práticas próprias da crítica. Uma orientação construtivista e pragmática tornou-se assim declaradamente predominante nos últimos representantes da estética analítica, entre os quais, além de Goodman, podemos recordar J. Margolis, A.c. Danto e R. Shusterman. Isto levou, além do mais, à reavaliação da linha teórica proposta por G.E. Moore nos Principia ethica (1903). Embora antiessencialista, de facto Moore mostrara-se sensível ao problema do valor e da beleza (incluindo a da natureza), ao mesmo tempo que se mantinha indiferente às aquisições e aos resultados da crítica artístico-literária.
Ora, verificaram-se fundamentalmente dois modos de fazer a análise: um destinado a reduzir os conceitos ou factos aos seus componentes ou propriedades de base, o outro, pelo contrário, orientado simplesmente para a clarificação de noções vagas e problemáticas, no sentido da diferenciação dos diversos usos e dos vários matizes de significado de certos campos semânticos. Deste ponto de vista, não há dúvida que em estética se praticou sobretudo este segundo modo de análise, na senda das obras do último Wittgenstein, a partir dos anos cinquenta. Desta perspectiva, que se limita à clarificação dos conceitos da linguagem corrente, distingue-se uma linha mais propriamente crítico-construtivista, com base na filosofia de Carnap e que em estética se refere sobretudo à obra de Nelson Goodman (Linguaggi), nem sempre vista como pertencente à linha analítica. Os traços mais comuns que caracterizam as teorias estéticas dos autores de inspiração analítica (entre os quais podemos recordar M. Weitz, A. Isenberg, F.N. Sibley, S. Hampshire, W. Kennick, J.A. Passmore, W.B. Gallie) consistem no antiessencialismo e na procura de clareza. O alvo polémico da estética analítica é a pretensão da estética tradicional de impor uma unidade – que para os analistas não pode deixar de ser espúria e artificial – entre as diversas artes, por meio do emprego de termos de tal modo gerais que obstam toda a diferença a favor de fórmulas ocas, tais como «expressão», «forma», «beleza», «representação», etc. Desta forma, a estética analítica acabou por conceber-se a si própria fundamentalmente como disciplina aplicada, empenhada principalmente em clarificar e destacar os conceitos de arte e de crítica de arte. Como a filosofia analítica em geral, ao discutir os fundamentos lógicos e epistemológicos do conhecimento científico, se aplicou principalmente na clarificação dos conceitos da ciência, do mesmo modo se definiu a estética analítica como disciplina clarificadora dos conceitos usados pela crítica literária e artística, das quais se espera o estudo propriamente dito, sistemático e científico, das diferentes artes. A estética analítica, a partir dos anos cinquenta, e até à crise introduzida pelo pós-estruturalismo e pelo descontrucionismo, foi, no âmbito da filosofia anglo-saxónica, essencialmente uma metacrítica, ou seja, uma filosofia da crítica literária e artística, sem qualquer interesse por aquilo que se situa para além da linguagem e da sua intencionalidade. Uma característica ulterior da estética analítica, também ela relacionada com este seu carácter metacrítico, é a escassa atenção por ela prestada ao problema da avaliação e do valor da obra. Ao ignorar a dimensão valorativa, a estética analítica tentou definir-se como disciplina puramente descritiva e classificativa, capaz de conseguir resultados objectivos e científicos, prescindindo totalmente das determinações histórico-sociais da arte, e também de toda a referência mais ampla ao horizonte cultural em que a obra se situa. Tal corresponde ao registo a-histórico próprio da filosofia analítica no seu conjunto. Posto que a estética analítica se caracterizou por uma espécie de filosofia do exercício crítico, a sua crise a partir dos últimos decénios deve-se, em boa parte, precisamente à crise do cientismo na crítica e na teoria das artes. Justamente porque definira o seu projecto nos termos de uma descrição tendo subjacente a prática crítica, independentemente de toda a prescrição normativa, é que a estética analítica entrou em crise no momento em que se tomou manifesto não existir uma única lógica que subentenda o exercício da crítica. Esta crise levou, consequentemente, a estética analítica a orientar-se numa direcção mais programática e flexível, atenta à multiplicidade de práticas próprias da crítica. Uma orientação construtivista e pragmática tornou-se assim declaradamente predominante nos últimos representantes da estética analítica, entre os quais, além de Goodman, podemos recordar J. Margolis, A.c. Danto e R. Shusterman. Isto levou, além do mais, à reavaliação da linha teórica proposta por G.E. Moore nos Principia ethica (1903). Embora antiessencialista, de facto Moore mostrara-se sensível ao problema do valor e da beleza (incluindo a da natureza), ao mesmo tempo que se mantinha indiferente às aquisições e aos resultados da crítica artístico-literária.
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Olá Rui e Sérgio,
Há várias afirmações neste artigo que são totalmente falsas e o seu autor revela um grande desconhecimento da estética analítica.
Por exemplo, o problema do valor tem sido abundantemente discutido na estética analítica e não só nos últimos anos, ao contrário do que diz o autor. Tanto Beardsley, nos anos 50 do século passado, como Goodman, em Linguagens da Arte, apresentam de forma bastante desenvolvida teorias do valor da arte (o instrumentalismo estético, no caso de Beardsley e o cognitivismo no caso de Goodman).
Goodman e Beardsley são, de resto, bons exemplos de filósofos sistemáticos, que apresentam uma perspectiva integrada dos diferentes problemas da arte, contradizendo assim a ideia de que os filósofos analíticos se dedicam apenas à análise conceptual e a pormenores de carácter linguístico.
Também a afirmação de que o pós-estruturalismo e o desconstrutivismo obrigaram a uma alteração no panorama da estética analítica é simplesmente delirante. Na verdade, o impacto dessas metodologias na filosofia da arte analítica foi e continua a ser praticamente nulo.
Mas a passagem mais disparatada é aquela em que se fala da crise da estética analítica nos últimos decénios. Confesso que não consegui evitar a gargalhada. Foi precisamente nos últimos vinte anos que a estética analítica exibiu uma vitalidade nunca antes vista. A quantidade, a diversidade e o nível de discussão das obras publicadas nos últimos anos têm sido simplesmente esmagadores. E não arrisco nada se disser que mais de 90% do que se publica em todo o mundo sobre estética e filosofia da arte é estética e filosofia da arte analítica.
Goodman, Danto, Margolis e Shusterman, citados pelo autor como os últimos representantes da estética analítica, estão muito longe de o ser. Onde isso já vai! Até nomes bem mais recentes como Carroll, Dickie, Levinson, Budd, Davies, Scruton, Wollheim, Kivy ou Walton se tornaram já clássicos.
O que se discute actualmente na estética e filosofia da arte analítica vai da ontologia da arte à teoria do valor, da interpretação e avaliação da arte à expressão e à representação, da autenticidade à ficção e à criatividade, etc.
De resto, a ideia que o autor tem da filosofia analítica (associando-a ao cientismo e ao positivismo lógico) é completamente anacrónica e desinformada.
Já tinha achado muito confuso e impreciso o texto do mesmo autor sobre a estética fenomenológica, mas este é simplesmente enganador.
Quero, contudo, dar-vos os parabéns pelo excelente blogue, que, como se vê, sigo atentamente. Continuem.
Aires,
Agradecemos o comentário, que muito enriquece o blogue.
O livro em causa é recente (2003) e dele demos nota há algumas semanas: Páginas de Filosofia: Gianni Carchia e Paolo D’Angelo, Dicionário de Estética
Brevemente publicaremos neste espaço novas abordagens introdutórias sobre estética analítica e estética fenomenológica.
Um abraço,
Sérgio
A edição original data de 1999 e a primeira tradução portuguesa é de 2003. Em 2009 saiu uma nova edição da mesma obra, sempre pela mão das Edições 70.
Humm… no outro post diz-se que é da Gradiva. Se for, garanto que nada tenho a ver com a sua publicação 😉
Uma coisa estranha no panorama editorial português é haver tantos livros excelentes para traduzir sobre os mesmos assuntos e vai-se tantas vezes buscar uns autores obscuros e confusos.
Por exemplo, há tantas introduções à lógica muito boas, mas as Edições 70 foram traduzir um livro de um obscuro autor francês, chamado Thiry (ou coisa parecida), em que as asneiras de palmatória se atrapalham umas às outras e quase todas as páginas do livro. É incompreensível.
Este comentário foi removido pelo autor.
Já corrigido: é mesmo das Edições 70.
Uma das poucas coisas interessantes desse livro do Thiry era a frase inicial: Não é necessário, e é até mesmo provavelmente inútil, iniciar um estudo da lógica tecendo longas considerações teóricas sobre o domínio da lógica, os seus meios, os seus limites, os seus métodos. Estas questões são demasiado complexas e só podem ser realmente percebidas na própria prática da ciência lógica.
Infelizmente, o resto do livro deixa muito a desejar, pois existem erros sucessivos. Não tenho aqui o livro, mas lembro-me que um dos primeiros quadros sobre tabelas de verdade estava pejado de erros…
A propósito, como estamos de obras introdutórias à Estética? Nos meus tempos de faculdade as “bíblias” eram o Raymond Bayer (Breve História da Estética, o Denis Huisman (Estética, das Ed. 70) e o Walter Hess (Documentos para a compreensão da Pintura Moderna)
Em português, além dos livros referenciados na Crítica, não conheço mais nada…
Desculpa só agora responder, Sérgio.
Ainda em relação ao livro do Thiry, o problema principal até nem é ele ser desleixado; é mesmo o autor não saber lógica, pois há confusões básicas a eito.
Quanto aos livros de estética que referes, só um deles procura ser uma introdução à disciplina: o do Huisman, que eu já tive mas julgo ter oferecido a alguém ou então deitado ao lixo (sim, volta e meia deito alguns livros ao lixo e outros dou-os a quem os possa apreciar melhor).
O livro do Raymond Bayer (com tradução do José Saramago!) é um livro de história, quanto a mim filosoficamente desinteressante. Tive-o em tempos, mas também o dei.
O livro do Walter Hess ainda o tenho para aqui. É o mais informativo dos três, mas não é estética nem filosofia da arte. É um livro de história da pintura moderna.
Há muitas boas introduções à estética e filosofia da arte, mas em língua inglesa. Todos os anos aparecem novas introduções de grande qualidade, em que os problemas são claramente formulados, as teorias devidamente explicadas e até discutidas. Na Crítica vamos dando conta do que de melhor vai aparecendo e no novo Dicionário Escolar de Filosofia, organizado por mim, inclui-se no fim uma lista de livros recomendados em português, não só para a estética como para todas as principais disciplinas filosóficas.
Um abraço
Obrigado pela resposta. Efectivamente, em Português o que nos vai valendo são os trabalhos que referiste. De resto, há pouca coisa… Vai sendo tempo de traduzir :-;