Kant e o princípio da felicidade

O princípio da felicidade pode, sem dúvida, fornecer máximas, mas nunca aquelas que serviriam de leis da vontade, mesmo se se tomasse por objecto a felicidade universal. Com efeito, porque o conhecimento desta se baseia nos simples dados da experiência, uma vez que todo o juízo a seu respeito depende muito da opinião de cada um, a qual é também muito variável, podem certamente dar-se regras gerais, mas nunca regras universais, isto é, regras que, em média, são correctas na maior parte das vezes, mas não regras que devem sempre e necessariamente ser válidas; por conseguinte, nenhumas leis práticas se podem basear neste princípio. Justamente porque um objecto do livre-arbítrio está aqui na base da sua regra e a deve, pois, preceder, esta não pode reportar-se senão ao que se sente, por conseguinte, à experiência, e só nela se pode fundamentar; e, nestas circunstâncias, a diversidade do juízo deve ser infinita. Este princípio não prescreve, pois, a todos os seres racionais as mesmas regras práticas, embora estejam compreendidas sob um título comum, a saber, o de felicidade. A lei moral porém, só é pensada como objectivamente necessária porque deve valer para todos os que possuem razão e vontade.
A máxima do amor de si (a prudência) aconselha simplesmente; a lei da moralidade manda. Existe, no entanto, uma grande diferença entre o que se nos aconselha e aquilo a que somos obrigados.
Kant, Crítica da razão prática, tr. Artur Morão, Edições Setenta, Col. Grandes Filósofos, pp. 179, 180.
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