A mente não é uma “tabula rasa”

Vinculada à teoria da indução, encontramos outra ideia segundo a qual a mente do investigador deve carecer de supostos prévios, de hipóteses, de suspeitas e de problemas. Em definitivo, deve ser uma tabula rasa na qual mais tarde se reflecte o
livro da natureza. Popper chama ‘observacionismo’ a esta noção e considera-a um mito. O observacionismo é um mito filosófico porque na realidade nós somos uma tabula plena, uma superfície cheia de sinais que a tradição ou a evolução cultural nela deixou. A observação está sempre orientada por expectativas teóricas (…). Segundo Popper, a mente sem juízos prévios não é uma mente pura, mas apenas uma mente vazia. Operamos sempre mediante teorias, ainda que frequentemente não tenhamos consciência disso. ‘A observação pura, a observação carente de uma componente teórica, não existe. Todas as observações – e em especial todas as observações experimentais – são observações de factos realizadas à luz desta ou daquela teoria.’ Com esta perspectiva, Popper inverte a postura daqueles que defenderam que a observação deve preceder todas as expectativas (ou hipóteses) e todos os problemas, afirmando mesmo que ‘todo o animal nasce com numerosas expectativas, geralmente inconscientes, ou, por outras palavras, se encontra dotado desde o nascimento de algo que corresponde muito proximamente às hipóteses e, portanto, ao conhecimento hipotético. Afirmo que temos sempre um conhecimento inato – inato neste sentido – do qual partimos, ainda que bem possa acontecer que não

nos possamos em absoluto fiar nele. Tal conhecimento inato, tais expectativas inatas, se se vêem defraudadas, originarão os nossos primeiros problemas, e o aumento do conhecimento que daí advém pode ser descrito como um aumento que consiste unicamente em correlações e modificações do conhecimento anterior’.

 G. Reale e D. Antiseri, Historia del Pensamiento Filosófico e Científico, Tomo Tercero,
Editorial Herder, Barcelona, 1992, pp. 892-893

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